segunda-feira, 5 de julho de 2010

O QUE É FILOSOFIA? Por Gilles Deleuze,Félix Guattari

Olá colegas,

Pesquisando, encontrei algo muito interessante, e quero compartilhar.

Diva

O que é a filosofia?

Por Gilles Deleuze,Félix Guattari
Tradução Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Munoz

A história da filosofia e comparável a arte do retrato. Não se trata de "fazer parecido", isto é, de repetir o que o filósofo disse, mas de produzir a semelhança, desnudando ao mesmo tempo o plano de imanência
que ele instaurou e os novos conceitos que criou. São retratos mentais noéticos, maquínicos. E, embora sejam feitos ordinariamente com meios filosóficos, pode-se também produzi-los esteticamente. E assim que Tinguely apresentou recentemente monumentais retratos maquínicos de filósofos, operando poderosos movimentos infinitos, conjuntos ou alternativos, redobráveis e desdobráveis, com sons, clarões, matérias de ser e imagens de pensamento, segundo planos curvos complexos (14). E, todavia, se é permitido apresentar uma crítica a um artista tão grandioso, parece que a tentativa não está ainda no ponto. Nada dança no Nietzsche, enquanto que
Tinguely soube tão bem, em outro lugar, fazer dançar as máquinas. O Schopenhauer nada nos revela de decisivo, quando as quatro Raízes, o véu de Maya parecem inteiramente prontos para ocupar o plano bifacial do Mundo como vontade e como representação. O Hei-degger não retem nenhum velamento-desvelamento sobre o plano de um pensamento que não pensa ainda.





Talvez tivesse sido necessário prestar mais atenção ao plano de imanência traçado como máquina abstrata, e aos conceitos criados como peças da máquina. Poder-se-ia imaginar, neste sentido, um retrato maquínico de Kant, ilusões compreendidas (ver esquema acima).

1. - O "Eu penso" com cabeça de boi, sonorizado, que não cessa de repetir Eu = Eu. / 2. – As categorias como conceitos universais (quatro grandes títulos): fios extensíveis e retráteis seguindo o movimento circular de 3. / 3. - A roda móvel dos esquemas. / 4. - O pouco profundo riacho, o tempo como
forma da interioridade na qual mergulha e emerge a roda dos esquemas. / 5. - O Espaco como forma da exterioridade: margens e fundo. / 6. - O eu passivo no fundo do riacho e como junção das duas formas. / 7. - Os princípios dos juízos sintéticos que percorrem o espaço-tempo. / 8. - O campo transcendental da experiência possível, imanente ao Eu (plano de imanência). / 9. - As três ideias, ou ilusões de transcendência (círculos girando no horizonte absoluto: Alma, Mundo e Deus).
Muitos são os problemas que concernem tanto a filosofia quanto a história da filosofia. As folhas do plano de imanência ora se separam até se oporem umas as outras, e convirem cada uma a tal ou tal filósofo, ora, ao contrário, se reúnem para cobrir ao menos períodos bastante longos. Além disso, entre a instauração de um plano pré-filosófico e a criação de conceitos filosóficos, as relações são elas próprias complexas. Num longo período, filósofos podem criar conceitos novos, permanecendo no mesmo plano e supondo a mesma imagem que um filósofo precedente, que eles reivindicarão como mestre: Platão e os neo-platônicos, Kant e os neo-kantianos (ou mesmo a maneira como Kant ele mesmo reativa certos segmentos do platonismo). Em
todo caso, não será, todavia, sem prolongar o plano primitivo, afetando-o com novas curvaturas, a ponto de que uma dúvida subsiste: não é um outro plano que foi tecido nas malhas do primeiro? A questão de saber em quais casos os filósofos são "discípulos" de um, outro e até que ponto, em quais casos, ao contrário, fazem enrica a ele mudando de plano, traçando uma outra imagem, implica pois avaliações tanto mais complexas e relativas quanto jamais os conceitos que ocupam um plano podem ser simplesmente deduzidos. Os conceitos, que vem povoar um mesmo plano, mesmo em datas muito diferentes e sob acomodações especiais, serão chamados conceitos do mesmo grupo; não serão assim chamados aqueles que remetem a planos diferentes. A correspondência de conceitos criados e de plano instaurado é rigorosa, mas faz-se sob relações indiretas que restam por determinar.
Pode-se dizer que um plano é "melhor" que um, outro ou, ao menos, que ele responde ou não as exigências da época? Que quer dizer responder as exigências, e que relação há entre os movimentos ou traços diagramáticos de uma imagem do pensamento e os movimentos ou traços sócio-históricos de uma
época? Estas questões só podem avançar se renunciamos ao ponto de vista estreitamente histórico do antes e do depois, para considerar o tempo da filosofia em detrimento da história da filosofia. (...)

(13) Cf. Kleist, "De 1'elaboration progressive des idees dans le discours" (Anedoctes et petits ecrits, Ed. Payot, p. 77). E Artaud, "Correspondance avec Riviere" (Obras completas, I).
(14) Tinguely, catalogo Beaubourg, 1989.

Um comentário:

  1. Olá pessoal. Você poderiam disponibilizar o arquivo do livro em PDF para download no blog.

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